segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Tristeza Lusa

 Saudações, hoje escrevo-vos de volta, porém digiro-me a vocês num tom mais melancólico. Numa tentativa, que já tem o fracasso anunciado, de realizar mais uma vez um exercício de lirismo que frequentemente é próximo da desinteresseira geral.

 Mas desenganem-se aqueles que pensam que eu não sou feliz, porque efectivamente sou uma das pessoas mais felizes do mundo. No entanto, como estou em território português achei por bem começar por frisar que me sentia particularmente em baixo ou pouco feliz. Isto porque, normalmente é um estado que os portugueses simpatizam, e era o suficiente para que despertasse o interesse de pelo menos 3 pessoas por este texto. Debrucemos-nos então sobre esta cruel temática que atormenta a nossa Nação. Porque raio convencionou-se que em Portugal “estar feliz” é considerado uma atitude de desrespeito à pátria?

  Irrita-nos, incomoda-nos profundamente ver portugueses realizados, contentes e cheios de alegria. Neste momento afirmar-se “sou feliz” em praça pública acaba por ser recebido com o mesmo tom pejorativo de “eu sou rico”, “eu não preciso de trabalhar” ou “sou melhor que vocês todos”. É escandaloso e ninguém deve estar feliz. Se estiver feliz é logo encharcado com juízos de valor como “é um despreocupado”, “não faz nada”, “é um zé-ninguém”. São pessoas que acima de tudo desrespeitam a vida e a desgraça dos outros. Os portugueses já sofrem bastante com o tédio, a frustração, a monotonia, o cansaço, a indignação geral com a política, greves e as leis; como podem conseguir ser felizes? No meio de todos estes problemas nem sobra espaço para as as suas desavenças e crises pessoais.. pobres miseráveis! Um povo que sofre traumaticamente de uma grave síndrome que não permite de forma alguma às pessoas terem pequenos prazeres, momentos de surtos de dopamina, alegrias e boa disposição. Os portugueses estão condenados a não ter alegria na vida, podem ter a esperança de um dia alegrar-se, porém rapidamente virá ao de cima aquele estado tipicamente descontente de quem nunca terá hipóteses de se vir a contentar. Mesmo no próprio dia do casamento, um momento nobre de celebração,  muitos noivos não conseguem desfrutar de um dos dias mais importante da sua vida porque ficam preocupadas se realmente tudo irá dar certo. No dia em que uma pessoa é promovida, frequentemente ela fica tão preocupada em dar conta da função que não comemora a sua vitória. E assim vamos perpetuando o nosso futuro trágico de tristeza.
   Em portugual o ideal é andar mais ou menos. Ou melhor, convém "ir-se andando". Não sejemos hipócritas quem nunca respondeu à aquela velha pergunta irritante: "Então? Bem disposto?" com a resposta: "Vai-se andando". É a resposta estipulada pela etiqueta para a situação, a única em que o interlocutor não fica chateado e até sente uma certa empatia por nós, por estarmos numa situação mais ou menos boa.

  Resumindo, em Portugal a felicidade é reprimida. Não se pode entrar feliz num lugar, nem enaltecer junto de outros os nossos triunfos pessoais mais recentes. Para evitar que nenhum senhor sisudo interpele-nos com "Então, que lhe aconteceu?", ou que nos lancem maus olhares de quem é um infractor das rígidas leis sociais. Portanto, dominem a vossa felicidade, eduquem-na, porque isso de andar feliz pode ser considerado um ato loucura e as pessoas podem pensar que estão a gozar com elas e com a sua desgraça.

- Adérito Dionísio 

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